domingo, 28 de março de 2010

CRÍTICA "BBB 10": DISCURSO DE BIAL TENTA REMEDIAR PROBLEMA CRIADO PELO PROGRAMA


Ao montar o elenco do BBB10 com três gays assumidos entre 17 participantes – quase 20% do total – a Globo deu um passo ousado. Lembre-se que estamos falando de uma emissora cuja direção jamais permitiu a exibição de um beijo entre dois homossexuais numa novela, clássica obra de ficção.

Dicesar, Serginho e Angélica entraram na casa dando show, conscientes que não estavam ali por acaso. Formavam um núcleo, que o diretor Boninho fez questão de sublinhar, chamando-os de “coloridos”. Ou seja, eram diferentes dos demais, tinham consciência disso e, para não restar dúvidas, foram claramente carimbados.

O que poderia resultar dessa “inclusão”, para usar uma palavra politicamente correta, num ambiente de guerra? Num jogo em que todos os participantes, em busca da cumplicidade do público, são inimigos uns dos outros e apenas um vence a batalha final? Evidentemente, “a questão homossexual” seria um tema presente – e foi, do primeiro ao 75º dia do BBB10.

Especialmente com a ajuda de Cacau, que encarou o assédio de Angélica de forma gaiata; de Michel, que estabeleceu uma cumplicidade ou flerte com Serginho; de Dourado, que abertamente entrou em confronto com o trio “colorido”; e do trio Boninho-Bial-Mr. Edição, que realçou o assunto de todas as formas, inúmeras questões ligadas à homossexualidade foram discutidas abertamente, de forma inédita, que eu lembre, no horário nobre da tevê brasileira, no BBB mais aberto, polêmico, intenso, discutido e comentado (ganhou até repercussão internacional) de todos.

Em público, o diretor Boninho, como de hábito, fingiu ignorar o que acontecia e, tanto em diferentes entrevistas quanto no seu Twitter, bateu insistentemente numa mesma tecla: o BBB é um jogo, não é um programa cultural, não é lugar para ensinar nada, estamos aqui apenas pela audiência e pelo dinheiro.

O problema é que, desta vez, a criatura foi maior que o criador. E uma parcela do público chiou. Surgiu na Internet e ganhou o mundo a palavra “heterofobia” – como se aqueles três homossexuais do programa tivessem a capacidade e o poder de simbolizar a opressão de uma minoria sobre uma maioria.

Para complicar um pouco mais o enredo, as marionetes do genial titereiro do BBB10 fizeram alguns movimentos não previstos. Dourado falou que homens heterossexuais não pegam Aids, trazendo de volta o fantasma da “peste gay”. Disse que perdeu o apetite ao ouvir uma conversa de Serginho sobre baladas gays no almoço. Lamentou que Angélica não fosse homem, pois, então, poderia quebrar os seus dedos. E cobrou de Dicesar que ele agisse como homem, “apesar de ser veado”.

A rivalidade que sempre existe entre torcidas de candidatos do BBB, estabeleceu-se, desta vez, em torno da questão sexual. Em alguns ambientes, como Twitter, blogs e fóruns, o diabo calçou Kichute, enviou ameaças a blogueiros e comentários pesados, como este, registrado sexta-feira neste espaço: “O grande problema desse BBB10 foi juntar gays a seres humanos! Força & Honra Mestre do Universo, Força Mestre Dourado!”

É difícil acreditar que o “boss” possa ter previsto isto. Mas ele insistiu em dizer que não estava nem aí. Há uma semana, fazendo sua conhecida pose de mau, voltou a afirmar, em entrevista à “Folha”: “Não colocamos ninguém no BBB para discutir homo ou heterofobia, minorias… Não escolhemos um personagem representando coisas. O fato de ser ou não homossexual não é para interagir no jogo. Não estou preocupado se o cara é gay ou não. Ele não vai entrar por ser gay, mas pelo que traz para a competição.”

Tamanha falta de seriedade teve um contrapeso neste sábado, no discurso que Pedro Bial preparou para a eliminação de Dicesar. Sem piadas de mau gosto, sem metáforas constrangedoras, sem psicologia de botequim, o apresentador foi direto ao ponto: “O BBB deturpa, deforma o retrato. Depois de tanta exposição, vocês se tornam caricatura”.

Em vez de mencionar os vários preconceitos de Dourado e as respostas sem pé nem cabeça de Dicesar, Bial lembrou uma rara “declaração de amor” de cada um dirigida ao outro no programa. “Aqui fora vocês têm que encontrar um meio de conviver, compartilhar”, disse aos dois, mirando, na verdade, as respectivas torcidas dos candidatos. “Vocês sabem que violência não é a solução”, disse o nosso Gandhi, conclamando os dois a darem as mãos.

Soou piegas? Soou. Pareceu ridículo? Pareceu. Deu vontade de rir? Deu. É assim que vai se educar a população a compreender e respeitar as diferenças? Lógico que não. Mas é impossível não reconhecer que Bial tentou remediar uma situação criada pelo programa. Já é alguma coisa.

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